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Impressões de um Boticário de Província

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sábado, 27 de agosto de 2011

Os farmacêuticos são o maior desperdício do SNS 

Vladimiro Jorge Silva, numa análise clarividente sobre os problemas actuais das Farmácias:

Farmácias em colapso. 20% sem dinheiro para repor stocks
  1. Tudo isto acontece porque o modelo farmacêutico português não tem viabilidade intrínseca: ao contrário das ideias que alguns tentaram fazer passar (com "estudos" científicos não escrutinados academicamente), a sociedade não reconhece ao papel do farmacêutico uma importância que valha cerca de 25% do PVP (sem IVA) dos medicamentos. E portanto quando é necessário cortar em algum lado, nada como iniciar essa tarefa pelas gorduras menos apetecíveis, deixando as greves de médicos e enfermeiros para segundas núpcias;
  2. Esta é uma questão que não se resolve com facilidade e que tem raízes muito mais profundas do que à primeira vista se possa pensar. Em primeiro lugar, a questão da necessidade: será que os farmacêuticos servem mesmo para alguma coisa? É que neste momento, pelo menos na dispensa de medicamentos sujeitos a receita médica, o seu papel pouco excede o de máquinas de vending de bata branca. A resposta é sim, claro que sim. É fundamental e verdadeiramente urgente a intervenção farmacêutica em áreas como a monitorização fármacoterapêutica dos doentes, verificação de interacções medicamentosas (no mesmo acto de prescrição, após consultas com médicos diferentes ou após a aquisição de medicamentos de venda livre), farmacovigilância, aconselhamento, participação em programas de saúde preventiva, promoção de terapêuticas medicamentosas custo-efectivas, lançamento de programas de cuidados farmacêuticos (como os que já existem para a asma e diabetes, por exemplo) e interligação com outros profissionais de saúde em termos de prestação de informação técnica especializada, acompanhamento de doentes (garantindo aspectos tão básicos e essenciais como a concordância e adesão à terapêutica através da disponibilização em permanência de ajuda especializada), gestão do risco clínico, renovação de receituário e revisão de medicação. Estas são, todas elas, áreas complexas e que actualmente estão a ser descuradas pelas farmácias e pelos farmacêuticos, não por falta de profissionalismo ou desconhecimento da realidade, mas simplesmente porque a pressão económica sobre as farmácias e a própria arquitectura do SNS não o permitem;
  3. Acresce referir que estão por contabilizar os custos associados às ineficiências causadas pela inexistência das medidas acima referidas e que seguramente ultrapassarão (em internamentos hospitalares, consumo de MCDTs e... novas aquisições de medicamentos!) largamente eventuais poupanças conseguidas pelo subfinanciamento de serviços farmacêuticos;
  4. As farmácias não são consideradas parte da rede de cuidados de saúde primários. Os farmacêuticos e médicos dos centros de saúde não se falam e desenvolveram relações de rivalidade e em certos casos mesmo completa aversão. Falta ao SNS uma cultura de colaboração conjunta e interligação entre os vários profissionais de saúde. As dificuldades de comunicação existentes limitam os benefícios de algumas iniciativas e são altamente prejudiciais aos doentes, quer em termos de saúde, quer sob o ponto de vista económico. Actualmente as equipas clínicas que actuam no SNS acabam por funcionar numa lógica de acumulação sequencial de actos individuais e não num contexto de decisão integrada e multidisciplinar. A falta de comunicação entre profissionais conduziu a uma segmentação do conhecimento e da respectiva intervenção, que em nada beneficia o doente, não contribui para optimizar recursos e até é susceptível de originar erros de medicação;
  5. As farmácias evoluíram num sentido perigoso e que em nada contribui para resolver este problema, antes pelo contrário. Os novos mini-mercados de saúde onde se faz um PSA, arranjam-se as unhas, experimentam-se sombras para os olhos, compram-se brinquedos de criança, sapatos ortopédicos e pulseiras electromagnéticas anti-stress servem para descredibilizar as instituições, consomem tempo a profissionais altamente qualificados e contribuem para que a percepção geral seja de que "se as farmácias já ganham dinheiro com tanta coisa, para quê continuar a existir uma margem na venda de medicamentos?";
  6. Por último, as faculdades de farmácia e a Ordem dos Farmacêuticos têm tido um papel absolutamente lamentável em todo este processo, negligenciando a criação de massa crítica e a inovação de novos modelos para a prestação de serviços farmacêuticos e aparecendo na praça pública apenas a defender interesses corporativistas e pouco aceitáveis aos olhos do resto da sociedade.

Os farmacêuticos são hoje uma profissão em vias de extinção.

A solução para inverter este caminho passa pela completa refundação do modelo farmacêutico português e pela demonstração ao governo das enormíssimas potencialidades económicas das alternativas. Os farmacêuticos devem ser pagos ao acto e não em função da margem de lucro. Devem existir prémios indexados a quotas orçamentais de poupança e monitorização efectiva de todo o processo. Imaginem o que seria a rede nacional de cuidados de saúde primários se lhe acrescentássemos 3000 entidades cuja função essencial fosse lutar pela adopção de medidas mais custo-efectivas!

As farmácias e os farmacêuticos são neste momento o maior desperdício do SNS, que financia todo um sector cujas capacidades seguidamente ignora.

Peliteiro,   às  18:57

Comentários:

 

Isso é muito bonito de se idealizar, mas o que fazer quando farmacêuticos proprietários de farmácia não agem como farmacêuticos, profissionais de saúde, mas sim como gestores e comerciantes (como dizia o outro...)? O rumo que o sector das farmácias tomou com Sócrates é, em parte, resultado disso mesmo. Antes de Sócrates o fruto já estava podre.

 

 

 

A verdade é que nos Estados Unidos já existem "vending machines" à saida das urgências de vários hospitais. O doente leva um código do médico, que introduz na máquina e sai o medicamento prescrito em unidose; pagamento com cartão de débito ou crédito. Tocando num botão, é possível falar com um farmacêutico por Skype através de um LCD na máquina. Funciona muito bem e os utentes estão muito satisfeitos.
# por Anonymous Americano : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Também há no Colorado um computador em que se responde a um logaritmo de dados e sintomas e o programa gera um diagnóstico e um tratamemto.
# por Anonymous John : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Sim, de facto, esse é o futuro a defender. Vending machines com "logaritmos"! - não confundir com algoritmos:)
O que mais me assusta não é haver tecnologia para isto, porque isso seria inevitável, é sim, haver pessoas, por vezes até ligadas ao sector, a defender este modelo.
É preciso usar os neurónios de vez em quando, e não apenas seguir a onda do que é "bué da fixe"
Tudo o que fazemos tem implicações futuras e convém pensar nisso antes de se avançar para novos serviços e produtos na farmácia.
Por exemplo, aqui fica um erro crasso, recente, no mundo das farmácias: Vacinas dadas por farmacêuticos, nas farmácias. Os estagiários que me digam se actualmente, têm alguma formação durante o curso que lhe permita dar injecções. Claro que podemos ter essa formação depois, mas aí também começaremos a ver enfermeiros que depois têm formação para vender caixinhas noscentros de enfermagem!

O Vladimiro tem toda a razão do mundo nesta análise que fez e que aliás, não é nova. Para que não tenha razão daqui a 20 anos, vai ser preciso muito bom farmacêutico envolvido na política entretanto. Sem isso, podemos atestar o óbito à nossa profissão e começar desde já a assistir à fusão entre técnicos e farmacêuticos... Até parece que a Ordem dos Farmacêuticos nem está assim tão contra a entrada dos técnicos num futuro mais ou menos próximo...
# por Blogger Farmasa : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Nos "States" o papel do farmacêutico está muito bem definido e não existem quaisquer dúvidas existenciais quanto à sua relevância. O farmacêutico é um profissional, regra geral bem pago que te "muita" facilidade em encontrar emprego. É um controlador de processos e é quem garante a qualidade no circuito do medicamento. Que algumas tarefas seja entregues a técnicos ou mesmo sejam automatizadas, em nada retira isso. Aliás, mesmo nas "vending machines", a parte nobre do processo, o aconselhamento está nas mãos do farmacêutico, como aliás está todo o processo de garantia de qualidade dos medicamentos dispensados. Em Portugal o facto de ter havido durante muitos anos a ligação propriedade & direcção técnica fez com que os farmacêuticos se tornassem pequenos burgueses e descurassem a parte técnica do que é uma profissão técnica. Enquanto nos EUA o farmacêutico vale pelo que sabe e pelo valor acrescentado que trás, em Portugal vale por um alvará e pela exclusividade que tem em se estabelecer em determinado sítio. Se perder isso, fica com muito pouco. O proteccionismo pode ter servido para enriquecer alguns, mas também fez com que os farmacêuticos em Portugal deixassem de ter a necessidade de se afirmar como técnicos e agora é difícil recuperar isso.
# por Anonymous Americano : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

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