<$BlogRSDUrl$> Impressões de um Boticário de Província
lTradutor Translator
Amanita muscaria

Impressões de um Boticário de Província

Desde 2003


sábado, 27 de agosto de 2011

Os farmacêuticos são o maior desperdício do SNS 

Vladimiro Jorge Silva, numa análise clarividente sobre os problemas actuais das Farmácias:

Farmácias em colapso. 20% sem dinheiro para repor stocks
  1. Tudo isto acontece porque o modelo farmacêutico português não tem viabilidade intrínseca: ao contrário das ideias que alguns tentaram fazer passar (com "estudos" científicos não escrutinados academicamente), a sociedade não reconhece ao papel do farmacêutico uma importância que valha cerca de 25% do PVP (sem IVA) dos medicamentos. E portanto quando é necessário cortar em algum lado, nada como iniciar essa tarefa pelas gorduras menos apetecíveis, deixando as greves de médicos e enfermeiros para segundas núpcias;
  2. Esta é uma questão que não se resolve com facilidade e que tem raízes muito mais profundas do que à primeira vista se possa pensar. Em primeiro lugar, a questão da necessidade: será que os farmacêuticos servem mesmo para alguma coisa? É que neste momento, pelo menos na dispensa de medicamentos sujeitos a receita médica, o seu papel pouco excede o de máquinas de vending de bata branca. A resposta é sim, claro que sim. É fundamental e verdadeiramente urgente a intervenção farmacêutica em áreas como a monitorização fármacoterapêutica dos doentes, verificação de interacções medicamentosas (no mesmo acto de prescrição, após consultas com médicos diferentes ou após a aquisição de medicamentos de venda livre), farmacovigilância, aconselhamento, participação em programas de saúde preventiva, promoção de terapêuticas medicamentosas custo-efectivas, lançamento de programas de cuidados farmacêuticos (como os que já existem para a asma e diabetes, por exemplo) e interligação com outros profissionais de saúde em termos de prestação de informação técnica especializada, acompanhamento de doentes (garantindo aspectos tão básicos e essenciais como a concordância e adesão à terapêutica através da disponibilização em permanência de ajuda especializada), gestão do risco clínico, renovação de receituário e revisão de medicação. Estas são, todas elas, áreas complexas e que actualmente estão a ser descuradas pelas farmácias e pelos farmacêuticos, não por falta de profissionalismo ou desconhecimento da realidade, mas simplesmente porque a pressão económica sobre as farmácias e a própria arquitectura do SNS não o permitem;
  3. Acresce referir que estão por contabilizar os custos associados às ineficiências causadas pela inexistência das medidas acima referidas e que seguramente ultrapassarão (em internamentos hospitalares, consumo de MCDTs e... novas aquisições de medicamentos!) largamente eventuais poupanças conseguidas pelo subfinanciamento de serviços farmacêuticos;
  4. As farmácias não são consideradas parte da rede de cuidados de saúde primários. Os farmacêuticos e médicos dos centros de saúde não se falam e desenvolveram relações de rivalidade e em certos casos mesmo completa aversão. Falta ao SNS uma cultura de colaboração conjunta e interligação entre os vários profissionais de saúde. As dificuldades de comunicação existentes limitam os benefícios de algumas iniciativas e são altamente prejudiciais aos doentes, quer em termos de saúde, quer sob o ponto de vista económico. Actualmente as equipas clínicas que actuam no SNS acabam por funcionar numa lógica de acumulação sequencial de actos individuais e não num contexto de decisão integrada e multidisciplinar. A falta de comunicação entre profissionais conduziu a uma segmentação do conhecimento e da respectiva intervenção, que em nada beneficia o doente, não contribui para optimizar recursos e até é susceptível de originar erros de medicação;
  5. As farmácias evoluíram num sentido perigoso e que em nada contribui para resolver este problema, antes pelo contrário. Os novos mini-mercados de saúde onde se faz um PSA, arranjam-se as unhas, experimentam-se sombras para os olhos, compram-se brinquedos de criança, sapatos ortopédicos e pulseiras electromagnéticas anti-stress servem para descredibilizar as instituições, consomem tempo a profissionais altamente qualificados e contribuem para que a percepção geral seja de que "se as farmácias já ganham dinheiro com tanta coisa, para quê continuar a existir uma margem na venda de medicamentos?";
  6. Por último, as faculdades de farmácia e a Ordem dos Farmacêuticos têm tido um papel absolutamente lamentável em todo este processo, negligenciando a criação de massa crítica e a inovação de novos modelos para a prestação de serviços farmacêuticos e aparecendo na praça pública apenas a defender interesses corporativistas e pouco aceitáveis aos olhos do resto da sociedade.

Os farmacêuticos são hoje uma profissão em vias de extinção.

A solução para inverter este caminho passa pela completa refundação do modelo farmacêutico português e pela demonstração ao governo das enormíssimas potencialidades económicas das alternativas. Os farmacêuticos devem ser pagos ao acto e não em função da margem de lucro. Devem existir prémios indexados a quotas orçamentais de poupança e monitorização efectiva de todo o processo. Imaginem o que seria a rede nacional de cuidados de saúde primários se lhe acrescentássemos 3000 entidades cuja função essencial fosse lutar pela adopção de medidas mais custo-efectivas!

As farmácias e os farmacêuticos são neste momento o maior desperdício do SNS, que financia todo um sector cujas capacidades seguidamente ignora.

Peliteiro,   às  18:57

Comentários:

 

Isso é muito bonito de se idealizar, mas o que fazer quando farmacêuticos proprietários de farmácia não agem como farmacêuticos, profissionais de saúde, mas sim como gestores e comerciantes (como dizia o outro...)? O rumo que o sector das farmácias tomou com Sócrates é, em parte, resultado disso mesmo. Antes de Sócrates o fruto já estava podre.

 

 

 

A verdade é que nos Estados Unidos já existem "vending machines" à saida das urgências de vários hospitais. O doente leva um código do médico, que introduz na máquina e sai o medicamento prescrito em unidose; pagamento com cartão de débito ou crédito. Tocando num botão, é possível falar com um farmacêutico por Skype através de um LCD na máquina. Funciona muito bem e os utentes estão muito satisfeitos.
# por Anonymous Americano : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Também há no Colorado um computador em que se responde a um logaritmo de dados e sintomas e o programa gera um diagnóstico e um tratamemto.
# por Anonymous John : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Sim, de facto, esse é o futuro a defender. Vending machines com "logaritmos"! - não confundir com algoritmos:)
O que mais me assusta não é haver tecnologia para isto, porque isso seria inevitável, é sim, haver pessoas, por vezes até ligadas ao sector, a defender este modelo.
É preciso usar os neurónios de vez em quando, e não apenas seguir a onda do que é "bué da fixe"
Tudo o que fazemos tem implicações futuras e convém pensar nisso antes de se avançar para novos serviços e produtos na farmácia.
Por exemplo, aqui fica um erro crasso, recente, no mundo das farmácias: Vacinas dadas por farmacêuticos, nas farmácias. Os estagiários que me digam se actualmente, têm alguma formação durante o curso que lhe permita dar injecções. Claro que podemos ter essa formação depois, mas aí também começaremos a ver enfermeiros que depois têm formação para vender caixinhas noscentros de enfermagem!

O Vladimiro tem toda a razão do mundo nesta análise que fez e que aliás, não é nova. Para que não tenha razão daqui a 20 anos, vai ser preciso muito bom farmacêutico envolvido na política entretanto. Sem isso, podemos atestar o óbito à nossa profissão e começar desde já a assistir à fusão entre técnicos e farmacêuticos... Até parece que a Ordem dos Farmacêuticos nem está assim tão contra a entrada dos técnicos num futuro mais ou menos próximo...
# por Blogger Farmasa : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

 

Nos "States" o papel do farmacêutico está muito bem definido e não existem quaisquer dúvidas existenciais quanto à sua relevância. O farmacêutico é um profissional, regra geral bem pago que te "muita" facilidade em encontrar emprego. É um controlador de processos e é quem garante a qualidade no circuito do medicamento. Que algumas tarefas seja entregues a técnicos ou mesmo sejam automatizadas, em nada retira isso. Aliás, mesmo nas "vending machines", a parte nobre do processo, o aconselhamento está nas mãos do farmacêutico, como aliás está todo o processo de garantia de qualidade dos medicamentos dispensados. Em Portugal o facto de ter havido durante muitos anos a ligação propriedade & direcção técnica fez com que os farmacêuticos se tornassem pequenos burgueses e descurassem a parte técnica do que é uma profissão técnica. Enquanto nos EUA o farmacêutico vale pelo que sabe e pelo valor acrescentado que trás, em Portugal vale por um alvará e pela exclusividade que tem em se estabelecer em determinado sítio. Se perder isso, fica com muito pouco. O proteccionismo pode ter servido para enriquecer alguns, mas também fez com que os farmacêuticos em Portugal deixassem de ter a necessidade de se afirmar como técnicos e agora é difícil recuperar isso.
# por Anonymous Americano : segunda-feira, agosto 29, 2011

 

 

Enviar um comentário


 

 

 

ARQUIVOS

maio 2003      junho 2003      julho 2003      agosto 2003      setembro 2003      outubro 2003      novembro 2003      dezembro 2003      janeiro 2004      fevereiro 2004      março 2004      abril 2004      maio 2004      junho 2004      julho 2004      agosto 2004      setembro 2004      outubro 2004      novembro 2004      dezembro 2004      janeiro 2005      fevereiro 2005      março 2005      abril 2005      maio 2005      junho 2005      julho 2005      agosto 2005      setembro 2005      outubro 2005      novembro 2005      dezembro 2005      janeiro 2006      fevereiro 2006      março 2006      abril 2006      maio 2006      junho 2006      julho 2006      agosto 2006      setembro 2006      outubro 2006      novembro 2006      dezembro 2006      janeiro 2007      fevereiro 2007      março 2007      abril 2007      maio 2007      junho 2007      julho 2007      agosto 2007      setembro 2007      outubro 2007      novembro 2007      dezembro 2007      janeiro 2008      fevereiro 2008      março 2008      abril 2008      maio 2008      junho 2008      julho 2008      agosto 2008      setembro 2008      outubro 2008      novembro 2008      dezembro 2008      janeiro 2009      fevereiro 2009      março 2009      abril 2009      maio 2009      junho 2009      julho 2009      agosto 2009      setembro 2009      outubro 2009      novembro 2009      dezembro 2009      janeiro 2010      fevereiro 2010      março 2010      abril 2010      maio 2010      junho 2010      julho 2010      agosto 2010      setembro 2010      outubro 2010      novembro 2010      dezembro 2010      janeiro 2011      fevereiro 2011      março 2011      abril 2011      maio 2011      junho 2011      julho 2011      agosto 2011      setembro 2011      outubro 2011      novembro 2011      dezembro 2011      janeiro 2012      fevereiro 2012      março 2012      abril 2012      maio 2012      junho 2012      julho 2012      agosto 2012      setembro 2012      outubro 2012      novembro 2012      dezembro 2012      janeiro 2013      fevereiro 2013      março 2013      abril 2013      maio 2013      junho 2013      julho 2013      agosto 2013      setembro 2013      outubro 2013      novembro 2013      dezembro 2013      janeiro 2014      fevereiro 2014      março 2014      abril 2014      maio 2014      junho 2014      julho 2014      setembro 2014      outubro 2014      novembro 2014      dezembro 2014      janeiro 2015      fevereiro 2015      março 2015      abril 2015      maio 2015      junho 2015      julho 2015      agosto 2015      setembro 2015      outubro 2015      novembro 2015      dezembro 2015      janeiro 2016      fevereiro 2016      março 2016      abril 2016      junho 2016      julho 2016      agosto 2016      setembro 2016      outubro 2016      novembro 2016      dezembro 2016      janeiro 2017      fevereiro 2017      março 2017      maio 2017      setembro 2017      outubro 2017      dezembro 2017      abril 2018      maio 2018      outubro 2018      janeiro 2019      fevereiro 2019      julho 2020      agosto 2020      junho 2021      janeiro 2022      agosto 2022      março 2024     

 

Perfil de J. Soares Peliteiro
J. Soares Peliteiro's Facebook Profile

 


Directórios de Blogues:


Os mais lidos


Add to Google

 

 

Contactos e perfil do autor

 

 

Portugal
Portuguese flag

Blogues favoritos:


Machado JA

Sezures

Culinária daqui e d'ali

Gravidade intermédia

Do Portugal profundo

Abrupto

Mar Salgado

ALLCARE-management

Entre coutos e coutadas

Médico explica

Pharmacia de serviço

Farmácia Central

Blasfémias

31 da Armada

Câmara Corporativa

O insurgente

Forte Apache

Peopleware

ma-shamba



Ligações:

D. G. Saúde

Portal da Saúde

EMEA

O M S

F D A

C D C

Nature

Science

The Lancet

National library medicine US

A N F

Universidade de Coimbra


Farmacêuticos sem fronteiras

Farmacêuticos mundi


This page is powered by Blogger. Isn't yours?

Creative Commons License
Licença Creative Commons.